Água pura da fonte


VIEIRA JUNIOR
Estudante de jornalismo

Crédito: Vieira Junior


Sexta-feira, 23h45. Como de costume, eu estava em frente ao computador me dedicando às tarefas acadêmicas. Senti a garganta seca. Era de se esperar: bateu aquela sede! Insisti em esperar um pouco mais para buscar um copo de água, mas em questão de minutos o desconforto aumentou. Levantei e fui até a geladeira. Lá, nenhuma garrafa de água. Decidi ir até o outro filtro com o copo na mão. A água estaria em temperatura ambiente, mas o dia nem estava tão abafado.

Pressionei a torneira do pote. Nada! Não caiu uma gota se quer. “Como assim?”, questionei-me. Tirei o galão de água de cima do pote e, envolta dele, os dizeres: “Água pura da fonte”. Foi então que fiz o que todos já devem ter feito um dia: olhei dentro do pote para ver se restara um pouco de água e... Nada, estava seco! Já tinham feito isso antes de mim. Ninguém em casa percebeu que a água estava acabando e, quando perceberam, já era tarde, os postos já estavam fechados e as distribuidoras também.

Obviamente, coloquei o galão no lugar e, não sei o porquê, fui novamente para a geladeira. Claro, o resultado foi o mesmo. Guardei o copo e fui me deitar. Comigo, a sede.

Levantei de novo. Abre geladeira, fecha geladeira. Tira o galão do pote, põe o galão no pote. Nada. Água da torneira? Nem pensar. Moro em Americana, cidade que faz captação no rio Piracicaba, manancial considerado classe 4 em poluição - metal pesado é o mínimo que se encontra nessas águas. Dez minutos depois eu estava abrindo a torneira. Lá vem ela, límpida e incolor.

Nem sei explicar a sensação que senti, foi estranho. Levei o copo até a boca e... Não deu. A aparência límpida e incolor deu lugar ao cheiro forte de cloro e tantos produtos químicos que o líquido foi submetido no tratamento. O gosto então, insuportável! Aliás, desde as primeiras séries na escola aprendi que a água é um líquido incolor, sem cheiro ou gosto. Não, não é o que temos hoje. Claro, desisti de beber a água da torneira para evitar um problema maior de saúde.


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Imagens: Tito Livio

Já passava da meia-noite e eu perambulava pela casa, até que tive a idéia mais brilhante: gelo. Com certeza tinha gelo em casa. Retirei-os de uma das formas e comecei a me saciar. Um, dois, três... A sensação não era das melhores, mas era o que tinha. No terceiro gelo, com a sede um pouco menos desesperadora, comecei a pensar em que ponto eu havia chegado. Hoje, na maioria das cidades é impossível pensar em abrir a torneira e saciar a sede. Os rios foram transformados quase em esgoto e, para quê? Pra saciar a sede de quem? E que sede é essa?

Na ânsia do consumismo desenfreado a humanidade avança por limites irreparáveis. Parece que ninguém da casa percebe que os recursos estão se acabando. Aliás, os que percebem, buscam guardar o último gole para si.  O Planeta Terra é a nossa casa e, se a população não se der conta de que tudo está se esgotando, chegará o momento em que será tarde demais... Não haverá para quem recorrer diante da sede - não só de água, mas de vida.

Nesse processo, destaco o papel da mídia que, em vez de utilizar o meio ambiente para promoção do chamado “marketing verde”, que favorece muitas empresas podres ambientalmente falando, deveria abrigar e repassar conceitos educativos e conscientizadores para a promoção do consumo sustentável. Todos da “casa” precisam acordar. Se os recursos acabarem, somente uma minoria terá acesso à vida. Sim, ela também será privatizada, como a água (de qualidade) já está. O futuro não é logo ali, é agora. Já vivemos as previsões catastróficas de anos atrás.  Basta “tirar o galão do pote” e ver que o planeta já não agüenta mais.

A água já está privatizada, segundo educadora ambiental

 Imagens: Tito Livio