JOSÉ PEDRO MARTINS
Jornalista e escritor
Rio Piracicaba Vieira Junior/ Consórcio PCJ |
O Festival de Música Ecológica foi uma das múltipas ações, entre o final da década de 1970 e início da de 1980, que tornaram Piracicaba e região o principal centro de discussões ambientais no Brasil. O ponto central era a defesa do rio, que corta o coração da cidade e cuja agonia era vista a olho nu pela população.
Dois principais fatores alimentaram o movimento ambientalista em Piracicaba. O primeiro, o Proálcool, a alternativa dos militares para combater a crise do petróleo. De um lado o Programa Nacional do Álcool representou crescimento econômico e abertura das portas tecnológicas que levaram à importância que tem o etanol hoje e, de outro, a ausência de legislação e cuidados pelo segmento na época levaram à degradação da bacia.
Foto Le Tota/ Sxc.hu |
Os resíduos do processamento do álcool eram lançados diretamente nos rios, que a todo momento expunham suas dores, com mortandades de peixes e outras cenas de grande impacto. Depois isso cessou, com a utilização dos resíduos na própria cultura da cana e com avanços da legislação e procedimentos tomados pelo setor sucroalcooleiro.
A segunda motivação daquele movimento foi o início das operações do Sistema Cantareira, que passou a retirar água da bacia do Piracicaba para abastecer metade da Grande São Paulo. Outra decisão da ditadura, tomada sem consultas à sociedade.
Estas são as raízes do processo que levou à constituição, em 1989, do Consórcio Intermunicipal das bacias dos Rios Piracicaba e Capivari, e de outras ações que consolidaram a região como espaço de reflexão sobre os destinos das águas. Espaço que contribuiu muito para a elaboração da Lei 9433/97, a Lei da Política Nacional de Recursos Hídricos, que representou grande reviravolta na gestão das águas no Brasil.
Uma das conseqüências da mobilização regional e formulação do marco legal foi o avanço no tratamento de esgotos domésticos, depositados nos rios pelas cidades. O índice de tratamento, de menos de 5% no final da década de 1980, hoje já é próximo de 50% na bacia.
Duas novas leis contribuem para cenário ainda mais promissor para a proteção das águas. São a Lei 11.445/2007, da Política Nacional de Saneamento, e a Lei 12.305/2010, da Política Nacional de Resíduos Sólidos. A formulação de planos municipais de saneamento e a meta de erradicar os lixões a céu aberto até 2014 são algumas das ações previstas nessas leis, que abrem melhor perspectiva para a universalização do saneamento no Brasil.
Foto: Vieira Junior |
Mas nada disso, avanços na legislação e novas tecnologias que proliferam a toda hora, será suficiente se não houver um reencantamento, um novo olhar do ser humano para os recursos naturais. Uma revolução cultural, reaproximando homem e natureza.
Esse o sentido original daquelas ações, lá nos anos 70 e 80, que começaram como uma indignação existencial, espiritual. Com uma nova postura, quem sabe, será cristalizada a utopia embutida nos versos iniciais de “O Rio”, de Zeza Amaral e Keula Ribeiro, interpretada no Festival do SESC pelo próprio Zeza: “Cada rio que nasce/ É uma moda de viola da natureza...”
*Este artigo foi veiculado na edição 69 (maio/2011) da revista Painel, da Unimep
*Este artigo foi veiculado na edição 69 (maio/2011) da revista Painel, da Unimep
Nenhum comentário:
Postar um comentário